Se esse amor
Ficar entre nós dois
Vai ser tão pobre amor
Vai se gastar...
Ficar entre nós dois
Vai ser tão pobre amor
Vai se gastar...
A Maçã
Raul Seixas e Paulo Coelho.
Mas planos - principalmente aqueles de um deslumbrado
imberbe - não se materializam por obra e graça da geração espontânea; precisam
ser postos em prática. E eu não havia contado a Zé Trindade toda a história. Subtraí o que me interessava
para arregimenta-lo – não daria ao meu compadre o gostinho de saber do piloto
de helicóptero.
Quando acabou o show do Teatro do Sesi, me aproximei do
palco e chamei o acordeonista da banda (Quirino, agora me lembro do seu nome) e
pedi:
- Você pode entregar esse bilhete a Zizi?
- Suba aí, vá no camarim, fale direto com ela.
Como o bilhete dizia que eu era um cara que fazia teatro em
Feira de Santana e que estava a fim de montar um musical onde queria a sua
participação, meu coração aos pulos achou que não era nada demais eu ir lá
dizer pessoalmente – ainda que as minhas pernas trêmulas não comungassem com
essa opinião. E foi assim, bambo de medo, que eu subi a escada lateral que dava
acesso ao palco e segui pro camarim.
Alguém já se sentiu no céu alguma vez? Eu já! Naquele
camarim, sob o feitiço de cumprimenta-la.
Ali estava ela. Meiga, com seus alvos dentinhos montados dando
estilo à sua face de fada,só pra mim – pelo menos naqueles parcos minutos de
eternidade. A mistura inebriante de perfume
com o seu suor de deusa, derramado sob os refletores , que se entranhou em mim
durante os beijinhos da apresentação, é algo que jamais esquecerei.
Quando me recompus, não deixei por menos.
- Zizi, sou de Feira, faço teatro, estou montando um musical
(pura mentira! eu não fazia ideia nem por onde começar o que ainda não sabia
que iria fazer) e blá, blá, blá.
Ela me olhou por uns segundos, com seus olhinhos de triturar
poeta e me surpreendeu.
- Claro, eu adoraria fazer.
Se eu já não acreditava em nada daquilo, a começar por mim,
como iria acreditar no que acabara de ouvir?
- Você topa mesmo?
- Sim, a gente só precisa conversar com calma, combinar
detalhes.
- E onde e quando podemos fazer isso.
- Amanhã de manhã mesmo, lá em minha casa. Conhece a Boca
do Rio?
- Sim.
- Pois então. Naquela rua assim, perto daquele assado, às
10h tá? Não vá faltar. Lá a gente vai ter todo o tempo e tranquilidade do mundo para
conversar, isso aqui tá uma loucura, tem muita gente.
Meu Deus! - pensei num relance - Também está acontecendo com
ela. Somos almas gêmeas.
- Ok! Serei pontual.
Nos despedimos e me dirigi em direção à rua, mais feliz do
que “pinto no lixo”. Tudo, agora, fazia total
sentido para mim (pensava enquanto caminhava). Quirino não querer levar o bilhete;
ela ter cantado A Maçã – a música que eu havia elegido para o nosso hino; o
encontro marcado logo para o outro dia, numa condição de intimidade... Sim, ela também
foi flechada, redundei de pensar. E enquantoatrevessava a porta que dava pra rua rua, não pude evitar de
cantarolar: Se eu te amo e tu me amas/ e esse amor a dois profana...
Eu não perdia por esperar.
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